«Um arqueiro quis caçar a lua. Noite atrás noite, sem descansar, lançou as suas flechas ao astro. Os vizinhos começaram a gozar com ele. Imutável, continuou a lançar as suas flechas. Nunca caçou a lua, mas tornou-se no melhor arqueiro do mundo!», Alexandro Jodorowsky
sexta-feira, dezembro 21, 2007
quarta-feira, outubro 31, 2007
Não consigo pensar... ponto! (de exclamação???)
Não consigo pensar... este é o tema. Estou de dieta. E dói-me um dente. Vamos por partes.
Estou agora a frequentar um mestrado em Lisboa... três dias por semana: segunda, terça e quarta-feira. Sim, eu sou de Leiria. Sim, eu moro em Leiria. Sim, trabalho em Leiria. Sim, estou completamente louca por estar para aqui a caminhar estes dias.
Ando cansada. Acho que estou a ficar velha demais e pior... não consigo pensar em nada o suficientemente abrangente e abstracto para continuar uma vida sã e sem mossas. Ainda há pouco me pus a pensar nas coisas que gostava antes de pensar e que me deixavam um sorriso nos lábios. Chiça!!! Não sai nada. Absolutamente. Um vazio oco na minha cabeça que de repente me colocou na opção de que não mereço esta cor de cabelo. Não entra nada... não sai nada destes neurónios cansados e necessitados de um sono restabelecedor.
Começo a pensar na dieta. Pior, pareço daquelas miúdas que só lê a Vogue e fica à espera das malas de brinde. Céus... eu comprei carteiras de brinde??? Que ainda por cima vinham na Lux Woman.
Estou derrotada. Sinto-me completamente estuprada pela civilização. Moldaram-me a mente e fizeram de mim uma zé igual a todas as outras e que me deixa desiludida... Preciso de mudar esta situação. Talvez tenha sido por esta situação que nunca mais por aqui deixei lamentos. Mas amigos, a minha vida é mesmo um caos e fora a minha vida não tenho mais nenhuma para viver. Quem me dera depor uma máscara e andar por ela de maneira diferente que não eu. Multiplicidade de vidas e de sentidos. Uma meta-vida. Uma tudo-junto e sem conteúdo.
Deêm-me conteúdo que já fiz um funeral aos neurónios.
Quanto ao dente. Cá está... a doer-me... é isso e a minha hérnia. Para além de burra ainda estou podre...
quarta-feira, setembro 19, 2007
Pirâmides, Colossos, Faraós, Libras, Regateios, Camelos, Viagens de Autocarro, Calor, Pobres...Muito Pobres!
Enfim…
A saudade e a nostalgia. Nunca pensei que me custasse tanto apanhar aquele avião de volta. De volta à vidinha normal depois de devaneios históricos, culturais e artísticos.
Nunca pensei que fosse possível existir mesmo aquilo que se vê nas fotografias das viagens dos outros. E não falo de Pirâmides. Falo de tudo o resto a que apontei a minha objectiva. Sempre virada para o céu. Para o enorme. Para o colossal.
Tudo é grande. Perfeito.
Tudo é inexplicável…
Por vezes via-me a tocar na pedra e a pensar… “é mesmo verdade” – “eu estou aqui”! Tudo é tão intenso. Tudo o que se viveu. Eu a aninha, a soninha e todas as pessoas que se foram cruzando a pouco e pouco na nossa vida, daquele nenhures terrestre.
Não tive os pés assentes no chão. Banhei-me no Nilo. Agarrei crocodilos. Entrei no templo de Abu Simbel. Toquei na estátua de Horus. Vi múmias. Vi magníficas peças de arte. Intensifiquei as amizades e fiz novas.
A vida tem muito destas coisas. De me dar presentes e ficar sentimentalista.
Obrigada aninha, soninha, ahmed, family frost… que saudades…
Volto! Quem volta comigo?
segunda-feira, agosto 20, 2007
ID: Não consigo parar de respirar
Não consigo parar de respirar. E se tentar, canso-me. Penso que todos já tentámos deixar de o fazer. Até porque respirar também cansa. No entanto, se deixarmos de o fazer, cansamo-nos ainda mais. Tenho de fazer força e fechar o nariz a boca e os ouvidos (que há quem diga que se respira pelos ouvidos). Tal exercício é desgastante. Pena que também me desgasta o acto de acordar, de comer, de andar, de criar, de sentir…
Por vezes gostava de gerir a minha vida a partir do meu quarto. Deitada na cama tomava as decisões fáceis e as difíceis. Dormia bastante sobre os assuntos, literalmente. Até porque, por vezes canso-me de ser tão activa. De não estar parada. De querer ser mais. Aprender mais. Criar mais. Concorrer a mais concursos. Partir em mais viagens. Que kitsch!
É claro que tal me leva a um desespero constante. O de nunca conseguir fazer tudo o que quereria. O que sonharia. Dói-me isso. E por vezes choro. Sentada sozinha sobre a minha cama azul decorada ao fundo com uma manta verde flash, que me aquece de todas as vezes que adormeço quando chego cansada a casa e me ponho a ver televisão.
Bebo muita água nestes dias. Ando muito desidratada. Principalmente de amor. Falta-me o amor e a paixão. E a dor que todo o amor pode trazer. Também ando um pouco irascível. Um pouco farta, aborrecida, entediada, enfastiada…
É a verdadeira silly season enquanto se trabalha. É o verdadeiro Agosto quente que me cobre do seu laisser faire, laisser passer, que não consigo contornar… e mesmo assim, tenho de continuar a produtividade…
Finally, we are no one!
quarta-feira, julho 25, 2007
Aljustrel Cultural
Tive um dia terrível de trabalho, é bem verdade. Já não venho cá há pacotes de massa… aceito. Vergo-me sobre a mesa e peço-vos «desculpem-me». No entanto, neste momento, enquanto a minha frase no msn continua «Eu despenteada mental e drama queen --- Ansiolíticos...PLEASE», há algo que ainda me fica na mente: «Ai Aljustrel, Aljustrel».
Pois é caro público, tive um fim-de-semana de fazer inveja a muitos gatos preguiçosos e outras cadelitas estrangeiras. Tive um fim-de-semana cultural como há poucos. E da mais sublime «culturalidade» a bem dizer… e isto devo a dois – claro, os homens dão-me volta à cabeça – artistas de primeira categoria – e às amigas de “cá de dentro”.
Dos rapazotes artistas, enquanto um dá os seus primeiros passos a solo ao nível musical, muito bem dados por sinal; o outro destaca-se como escultor (dos bons, entre nós).
O som vertiginoso do binómio «rejubilar/depressar»
De lembrar aquela noite fatídica – sim, em que me deitei às 06h30am –, em que vi ao vivo a estreia mundial de Pedro Azinheira e o seu Bubble Bath. Um som electrónico, original, com algumas influências de artistas mundiais, animou a noite que se previa repleta de Martinis de graça no "Pé de Kafé", e de Marlboros da Sophie.
O som fazia renascer os sentidos do corpo e lembrar os da mente. Houve momentos em que olhei para baixo e não vi chão. Enquanto houve outros em que me sentava na tristeza e olhava com fulgor o sol. O Pedro faz-nos sentir um misto de sensações (passo a redundância) desconexas. Quase paradoxais e sem sentido. “Tu és os Açores e as suas quatro Estações num só dia” – disse-lhe eu nessa noite. E sinceramente, não podia estar mais certa, ou ter encontrado melhores palavras. De uma calma de Sigur Rós, chega ao ímpeto de Dj Shadow passando um olhar sobre o comboio de Lali Puna. Óptimas influências. Digo eu – mas que percebo eu de música (contrabaixos e guitarras ainda vá, agora mais!!! LOL diria eu no msn).
Não consigo encontrar sinónimos para o «amo» o som Bubble Bath, ou para o contraditório «quero ouvir até me cansar». Pedrocas, não te esqueças de mim na próxima ok. Ah ah ah…
As formas de um mundo novo
O Ricardo Manso é uma outra surpresa. Não é que ao olhar para ele não consigamos discernir talento. Nada - o rapaz transborda talento pelos poros -, é que o Ricardo tem um olhar humilde e tímido. Qual não foi o meu espanto quando rebento pela exposição de escultura e desenho adentro: Pahhh!!!! O meu queixo a bater no chão. –“Rapaz, onde arranjaste o dom que eu vou já comprar três quilos?” – pensei. Não o disse. Eu também sou muito tímida (tusso com subtilidade).
O Ricardo não faz formas… reinventa-as. Transforma o real num sub-real subconsciente da própria realidade. Faz do comum uma figura que ele vê com a íris voltada ao contrário. Um olhar (de)compositor de planos. Um olhar que cria a consistência de um novo ser: a arte.
Eu também não entendo de arte. Tiro umas fotografias, e vou tendo umas aulas de desenho que me sufocam. No entanto, quando vejo talento arrepio e interesso-me. Fixo o olhar e não descolo, enquanto os pêlos do braço deixam a excitação de ver algo extremamente belo.
Para ele nem tive palavras. Acho que lhe disse: “Adorei o workshop e quero aulas tuas que eu pago. Além disto gosto desta peça!”. Eu nunca soube discernir a altura de dizer as coisas. Também sou muito tonta e atabalhuada.
No entanto, sou feliz!
Pedro, Ricardo, Mafa, Carla, Sophie e Ili, obrigada por me terem dado um fim-de-semana hilariante.
domingo, julho 01, 2007
Perdi-me... perdi-te...
Tentei perceber e compreender o porquê de encontrarmos certas pessoas e não encontrarmos outras.
Ninguém nunca pensou, no momento do casamento, do “happily ever after” – “ele só vai casar-se com ela porque a encontrou” – se não tivesse encontrado não casaria, de facto.
Existem milhares de almas espalhadas por esse mundo fora que teriam o coração aberto para me amar. Sei-o deveras. Mas nunca me encontraram. Vão esquecer-se de mim (de quem nunca se lembraram), e vão casar-se, descasar-se, enrolar-se com “alguéns”, que não eu, porque nunca se cruzaram comigo, naquele beco onde tu te cruzaste.
E porquê eu, e qual a razão de seres tu?
O universo escreve-se a giz cor-de-rosa. Receio ter de apagar qualquer coisa com “algodão que não engana”:
- A minha vida contigo.
- Os lençóis com o teu cheiro.
- A minha almofada, que foi a tua, impregnada da tua saliva, que me levava à demência.
A minha própria loucura levou-me à loucura. O meu esquecimento levou-me à minha cor “de burro quando foge”, misturada de desalento.
Hoje, sento-me junto da tua memória, e afago-lhe os cabelos. Hoje desejo-te da mesma maneira como te apertei junto a mim naquele beco, e te beijei com tanto ardor, que até as pernas se me fraquejaram. Só tu sabias despontar o fogo interno que me consumia as vísceras.
Porque é que só tu, não podias encontrar-me naquele beco. Porque é que só tu vives onde não te posso tocar?
segunda-feira, maio 28, 2007
It really grins my gears
Isto chateia-me tanto. Revolta-me tanto. Que, não fosse eu uma rapariga bem comportada e educada, desatava ao murro e à estalada. Para quê os encontrões, para chegar antes? Para quê as pisadelas porque não se olha para onde se anda (ainda hoje levei uma no autocarro por uma miúda que não viu que eu estava sentada naquele sítio, só faltou sentar-se em cima de mim)?
Nada disto faz sentido. Parece que andamos a concorrer uns com os outros. A fazer uma corrida eterna, para ver quem é melhor quem é pior. Não faz sentido, repito. Ainda hoje uma amiga minha da ìndia veio visitar-me e ao questionar-me sobre a minha eterna dieta eu respondi: “Ando a fazer uma nova”. Ela retorquiu com um simples: “Estás tão bem assim!!! Desiste disso! A gente quer é ser feliz!”.
Gostei. Quem me dera que tudo não passasse do meu desejo de emagrecer ou não e que pudesse controlar a mente dos outros de modo a que não aconteçam mais situações destas. Eu respeito os outros… digo e garanto.
Agora, quem é que me respeita a mim?
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sexta-feira, maio 11, 2007
Silêncio, estou à escuta!
terça-feira, março 27, 2007
segunda-feira, março 26, 2007
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sexta-feira, março 23, 2007
A COR DA FELICIDADE
quarta-feira, março 21, 2007
sábado, fevereiro 24, 2007
O 10.º Guardanapo do Aeroporto
I
Acordem-me noutra geração.
II
Há quem roube pensamentos? Há quem roube corações, é verdade. Não desminto. E coloco a minha mão sobre a bíblia. “Eu juro”. E prometo que não vou engelhar mais o coração, nem consumir a alma.
Mas os papéis rasgados lá continuam, encimando a mesa. Esquecidos pelo empregado que limpou a mesa 5 com o seu pano amarelo e o seu sorriso cor de laranja. Gostava de ter um sorriso cor de laranja de um empregado. Um sorriso que é mais fingimento que sorriso. Assim fingia a vida em vez de a viver. O que me poupava uma trabalheira de palavras entreditas e de questões éticas.
III
Se eu fosse de algodão, gostava de me apalpar todos os dias. Mas não queria ser um daqueles discos de limpeza de pele. Daqueles que retiram a maquilhagem. Não quero tirar nada a ninguém. Só quero dar.
Quero ser daqueles algodões embebidos em Betadine que curam as feridas. No entanto, se me rasgassem a mim, qual pobre algodão, quem limparia as minhas feridas? Ninguém. Depois de usado o algodão vai para o lixo.
IV
Olhaste para a esquerda primeiro. Seguiu-se a direita e vislumbraste toda a vida em frente. Era uma passadeira rolante que funcionava a petróleo Iraquiano ou Americano, ou o raio que o parta.
Tinhas o cabelo espetado em direcção ao céu e seguravas toda a verdade. Apenas a tua. Prendias a atenção em notas de música e a leituras de livros. Eras todo tu e todo meu. No momento de loucura, da paixão das unhas cravadas na pele.
Eras o café das noites longas e o abatanado das manhãs inseguras. Eras o guardanapo do desespero e a lâmpada da ilusão.
Chegaste a mim apenas de meias. Daquelas com pedaços de plástico na sola dos pés de andar por casa e pela vida. Nem te vi chegar e muito menos te vi partir. Quando te perdi nem sabias que te tinha encontrado e quando te encontrei já te tinhas esvanecido.
Eras tu. De sapatilhas cor de laranja a empurrar a vida com a gravata apertada.
Eras tu o que nunca foste.
V
O espaço em frente estava vazio. Esperei por ti a noite toda. Mas o castanho da cadeira sufocou-me.
Ao fim de 15 minutos não agüentei e afoguei-me nos muros da cidade (des)conhecida. Quis tanto que não aparecesses, que não apareceste mesmo. Quis tanto que não existisses, que te lembraste, desta vez, de me fazer a vontade.
VI
O Fernando Pessoa também escrevia em guardanapos. Não foi por isso que foi mais feliz. Mas hoje, estes guardanapos nunca limparam tão bem a minha alma.
VII
Se falo é porque sei magoar.
VIII
Questiono-me sobre o interesse desta divagação.
IX
Gostava de abrir o armário de cada vez que coço o nariz. De ir à casa de banho, quando pisco os olhos. Gostava de ver televisão a cada abrir de braços e de cozinhar massa com queijo e cogumelos de cada vez que esboço um sorriso.
Gostava de viver contigo debaixo das minhas unhas e de fazer amor em cima da minha pele. Gostava de esquecer e de reviver tudo outra vez.
Gostava que isto, onde escrevo, não fosse apenas um guardanapo.
X
Vou dar um saltinho até ali, mas gostava de não sair daqui.
A minha mente é um planisfério sem mala de viagem incluída.
O meu pensamento não sai daqui,
Mas vai até ali de quando em vez.
E por vezes esquece-se de mandar postal.
Perde-se e não sabe onde vai.
O meu pensamento deve ter filhos algures.
terça-feira, fevereiro 13, 2007
O meu escritor On-line
Tenho um escritor on-line, [Miguel Manso, que citei variadas vezes].
Conheço alguém que me faz ler um bocadinho de um livro todos os dias. Cada dia, um capítulo, uma história. Sempre online, qual ensino a distância...
E confesso que fico pasma com a criatividade. Com o talento.
O talento arrepia-me. Arrepiam-me as palavras. Até há cheiros e cores e gestos que me arrepiam quando tocam nas palavras, quando se transformam em palavras.
A cor dos dias nada mais é reflexo de um pensamento irrepetido de uma consciência olvidada. Afastamos tudo o que não é perceptível ou que julgamos imperceptível. Afastamos as coisas que não queremos ver. Afastamos o cinzento das manhãs; a humidade das horas do almoço; o obsoletíssimo vestuário; a mágoa de continuar; o querer avançar, mas ao mesmo tempo o desejar fugir.
Esquecemo-nos da ida ao café; do que comemos na noite passada. Por vezes até se nos escapam as pessoas com quem estivemos: quem foi, o que se falou. Esquecemo-nos daquela frase magnífica inventada à pressão em cima do guardanapo, que por sua vez ficou, também ele esquecido, entre os bolos do caixote do lixo da pastelaria, ou padaria ou café;
O que quer que seja que venha a acontecer, que aconteça!
[pensamos]
E vamo-nos esquecendo, das pequeninas coisas, que são só e apenas as coisas de que necessitamos para vivermos de sorriso Pepsodent nos lábios, ou para ser um artista da literatura.
Porque o que há de belo em cada livro é a sua semelhança com o quotidiano. E o que o artista faz é descrevê-lo, tão “geniosamente” que nos deixa maravilhados e boquiabertos.
Eu encontrei o meu génio. Que me faz ler um bocadinho todos os dias.
«Um dia apaixonei-me por uma mulher mas antes disso arranjei um gato. Uma gata, mais precisamente, que veio cá para casa quando era muito pequena. Não bastando isso de andar a trazer bichos para casa, a mulher por quem me apaixonei não se apaixonou por mim mas apaixonou-se pela gata, que não se apaixonou por ela nem por mim. Mas a gata era toda olhos redondos da cor da folha de louro seca e olhava-nos profundamente sem desviar o olhar (era uma gata napolitana nascida num pátio do bairro da Graça).»
sexta-feira, fevereiro 09, 2007
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quarta-feira, fevereiro 07, 2007
Doze razões por Vital Moreira
1.ª - O que está em causa no referendo é decidir se o aborto nessas condições deve deixar de ser crime, como é hoje, sujeito a uma pena de prisão até 3 anos (art. 140.º do Código Penal). Por isso, é francamente enganador chamar ao referendo o "referendo do aborto" ou "sobre o aborto", como muita gente diz. De facto, não se trata de saber a posição de cada um sobre o aborto (suponho que ninguém aplaude o aborto), mas sim de decidir se a mulher que não se conforma com uma gravidez indesejada, e resolve interrompê-la, deve ou não ser perseguida e julgada e punida com pena de prisão.
2.ª - Não há outro meio de deixar de punir o aborto senão despenalizando-o. Enquanto o Código Penal o considerar crime (salvas as excepções actualmente já existentes), ninguém que pratique um aborto está livre da humilhação de um julgamento e de punição penal. Quem diz que não quer ver as mulheres punidas, mas recusa a despenalização, entra numa insanável contradição. Não faz sentido manter o aborto como crime e simultaneamente defender que ele não seja punido.
3.ª - A actual lei penal só considera lícito o aborto em casos assaz excepcionais (perigo grave para vida ou saúde da mulher, doença grave ou malformação do nascituro, violação). Ao contrário do que correntemente se diz, a nossa lei não é igual à espanhola, que é bastante mais aberta do que a nossa e tem permitido uma interpretação assaz liberal, através da cláusula do "perigo para a saúde psíquica" da mulher. Por isso, a única saída entre nós é a expressa despenalização na primeira fase da gravidez, alterando o Código Penal, como sucede na generalidade dos países europeus.
4.ª - A despenalização sob condição de realização em estabelecimento de saúde autorizado (por isso não se trata de uma "liberalização", como acusam os opositores) é o único meio de pôr fim à chaga humana e social do aborto clandestino. Esta é a mais importante e decisiva razão para a defesa da despenalização. Nem a ameaça de repressão penal se mostra eficaz no combate ao aborto, nem a sua legalização faz aumentar substancialmente a sua frequência. A única coisa que se altera é que o aborto passa a ser realizado de forma segura e sem as sequelas dos abortos clandestinos mal-sucedidos. Por isso, se pode dizer que a legalização do aborto é uma questão de saúde pública.
5.ª - Se se devem combater os factores que motivam gravidezes indesejadas, é humanamente muito cruel tentar impô-las sob ameaça de julgamento e prisão. É certo que hoje há mais condições para evitar uma gravidez imprevista (contraceptivos, planeamento familiar, etc.). Mas a sociologia é o que é, mostrando como essas situações continuam a ocorrer, em todas as classes e condições sociais, mas especialmente nas classes mais desfavorecidas, entre os mais pobres e menos cultos, que acabam por ser as principais vítimas da proibição penal e do aborto clandestino (até porque não têm meios para recorrer a uma clínica no estrangeiro...).
6.ª - A despenalização do aborto até às 10 semanas é uma solução moderada e, mesmo, comparativamente "recuada", visto que em muitos países se vai até às 12 semanas. Por um lado, trata-se de um período suficiente para que a mulher se dê conta da sua gravidez e possa reflectir sobre a sua interrupção em caso de gravidez indesejada. Por outro lado, no período indicado o desenvolvimento do feto é ainda muito incipiente, faltando designadamente o sistema nervoso e o cérebro, pelo que não faz sentido falar num ser humano, muito menos numa pessoa. Como escrevia há poucos dias um conhecido sacerdote católico e professor universitário de filosofia: "A gestação é um processo contínuo até ao nascimento. Há, no entanto, alguns "marco" que não devem ser ignorados. (...) Antes da décima semana, não havendo ainda actividade neuronal, não é claro que o processo de constituição de um novo ser humano esteja concluído."
7.ª - Só a despenalização e a "desclandestinização" do aborto é que permitem decisões mais ponderadas e reflectidas, incluindo mediante aconselhamento médico e psicológico. Embora o referendo não verse sobre os procedimentos do aborto legal, nada impede e tudo aconselha que a lei venha a prever uma consulta prévia e um período de dilação da execução do aborto, como existe em alguns países. Aliás, o anúncio de tal propósito poderia ajudar o triunfo da despenalização no referendo, superando as hesitações daqueles que acham demasiado "liberal" o aborto realizado somente por decisão desacompanhada da mulher.
8.ª - A despenalização do aborto nos termos propostos não viola o direito à vida garantido na Constituição, como voltou a decidir o Tribunal Constitucional, na fiscalização preventiva do referendo. No conflito entre a protecção da vida intra-uterina e a liberdade da mulher, aquela nem sempre deve prevalecer. O feto (ainda) não é uma pessoa, muito menos às dez semanas, e só as pessoas são titulares de direitos fundamentais e, embora a vida intra-uterina mereça protecção, inclusive penal, ela pode ter de ceder perante outros valores constitucionais, nomeadamente a liberdade, a autodeterminação, o bem-estar e o desenvolvimento da personalidade da mulher. Mas a punição do aborto continua a ser a regra e a despenalização, a excepção.
9.ª - A decisão sobre a legalização ou não do aborto não pode obedecer a uma norma moral partilhada só por uma parte da sociedade. Ninguém pode impor a sua moral aos outros. É evidente que quem achar, por razões religiosas ou outras, que o aborto é um "pecado mortal" ou a violação intolerável de uma vida, não deve praticá-lo. Pode até empregar todo o proselitismo do mundo para dissuadir os outros de o praticarem. Mas não tem o direito de instrumentalizar o Estado e o direito penal para impor aos outros as suas convicções e condená-los à prisão, caso as não sigam. A despenalização do aborto não obriga ninguém a actuar contra as suas convicções; a punição penal, sim.
10.ª - A despenalização é a solução a um tempo mais liberal e mais humanista para a questão do aborto. Liberal - porque respeita a liberdade da mulher quanto à sua maternidade. Humanista - porque é o único antídoto contra as situações de miséria e de humilhação que o aborto clandestino gera. Quando vemos tantos autoproclamados liberais nas hostes do "não", isso é a prova de que o seu liberalismo se limita à esfera dos negócios e da economia, parando à porta da liberdade pessoal. Quando vemos tanta gente invocar o "direito à vida" do embrião ou do feto para combater a despenalização, ficamos a saber que para eles vale mais impor gravidezes indesejadas (e futuros filhos não queridos) do que a defesa da liberdade, da autonomia e da felicidade das pessoas. Se algo deve ser desejado, devem ser os filhos!
11.ª - Na questão da despenalização do aborto é verdadeiramente obsceno utilizar o argumento dos custos financeiros para o SNS. Primeiro, o referendo não inclui essa questão, deixando para a lei decidir sobre o financiamento dos abortos "legais". Segundo, mesmo que uma parte deles venham a ser praticados no SNS, o seu custo não deve comparar desfavoravelmente com os actuais custos da perseguição penal dos abortos, bem como das sequelas dos abortos mal sucedidos.
12.ª - A despenalização do aborto, nos termos moderados em que é proposta, será um sinal de modernização jurídica e cultural do país, colocando-nos a par dos países mais liberais e mais desenvolvidos, na Europa e fora dela (Estados Unidos incluídos). A punição penal do aborto situa-nos ao lado de um pequeno número de países mais conservadores e mais influenciados pela religião (como a Irlanda e a Polónia). Mas por que motivo um Estado laico deve pautar o seu Código Penal por normas religiosas?»
quarta-feira, janeiro 24, 2007
"Gosto de acordar porque é lá que tenho a minha vida"
Aquele que cruzou o meu caminho, enquanto vageava só no passeio, transformou-me. Custa-me a acreditar que depois de tudo ainda sinto a pele a estalar depois de todos os momentos desagradáveis. Das frases sem nexo. Sem desculpa. Tantas vezes sem medida. Basta ouvir o seu nome.
- "Gostava de voltar atrás, sabendo tudo o que sei hoje"
Aquela ansiedade, aquela nostalgia de voltar a ser feliz. De bater com a cabeça novamente, mas desta vez sem lágrimas: com a alegria de saber que ainda nos vamos recordar disto com um sorriso e uma angústia que não nos sai da pele.
Nem dos poros ainda abertos depois da água fervente do banho.
Houve uma certa altura até, em que me lavava quase freneticamente. Queria retirar as lembranças e o cheiro de outros corpos no meu corpo.
Houve também dias em que me tranquei no quarto com um cigarro e um Porto quente, desgostosa com a vida a sentir o charme do fumo sobre a lanterna que iluminava a rua e os cães vadios com cio.
Agora, olho para trás e vejo que fui feliz.
Custa-me a acreditar que houve um tempo perfeito. Em que a felicidade se prendeu com lágrimas e com dor e com angústia e lágrimas e dor e angústia.
A minha transbordou da vasilha como a do Álvaro. E sinto-me estúpida e ridícula.
Custa-me a acreditar que estou velha. Que já deixei de estudar há quase três anos. Que me quero ir embora deste País, desta terra…
Custa-me a acreditar que ainda me lembro de ti…
terça-feira, janeiro 16, 2007
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segunda-feira, janeiro 15, 2007
Enquanto houver dias...
Enquanto um vento extraordinariamente azul me gelava a cara.
Enquanto tremia de frio e de medo naquela manhã terrivelmente cinzenta de tristeza.
Tudo me pareceu vazio. O frasco de iogurte com “bifidus activo” matinal, estava vazio. A sandes de queijo, a bolacha Maria sem açúcar da Proalimentar, o café sem açúcar, mas “um pouco de adoçante se faz favor” – estava tudo vazio, oco, sem nada… sem caminho, nem entulho. Sem futuro.
Olhei para o PC e pensei no vazio, e na tristeza que é olhar para um PC, sem pensar que é mentira. É virtual. Tão virtual que tenho de imprimir e-mails, assinar, “veracificar”, para depois arquivar, de modo a que fique tudo verdadeiro e verossível. Do jeito que “Deus quiser”. E o que é que ele quer de mim? Quer que chore? Que doa? Que morra?
Preferia que me fizesse feliz. Afinal, quem não quer qualquer coisinha que o faça feliz?
Felicidade = Amor?
O amor é daqueles sentimentos intransigentes, que se nos assoberbam as artérias e nos fazem cuspir estupidezes.
Isto disse eu, num acto de plena inspiração, a uma vinda da hora de almoço. Afinal de barriga cheia também se pensa. E vejam bem que era cheia de sopa misturada com uma sandes de delícias do mar e uma Cola Light. Com tanta alimentação e tanta proteína o cérebro poderia parar e pensar: “é pá, isto agora é só tratar dos hemócritos e plaquetas, para que transportem a respectiva proteína para o arquivo”.
[aparte – o arquivo é aquela camada superficial de ser que se consegue retirar com uns trocos numa casa de pessoas de plástico conceituada].
Há dias em que a solidão pesa mais que um saco de batatas. Há dias em que a tristeza pesa mais que um saco de azeitonas. Há dias em que o trabalho explode como tremoços e arranha a garganta como 5 kg de chocolate.
Há dias em que me apetecia entrar na não-existência.
Há dias em que não me apetecia acordar.
Para quê abrir os olhos se não há beleza a contemplar?
quinta-feira, janeiro 11, 2007
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quinta-feira, janeiro 04, 2007
...Conselho de Ano Novo...
quarta-feira, janeiro 03, 2007
Stop
Embebida em Dave Mathews Band, acredito que tenha feito algumas caras estúpidas, de tal maneira que o rapaz que se sentou quase ao meu lado, me olhava com estranheza quando carreguei naquele botão maravilhoso do “Stop”, presente em qualquer autocarro, que nos impede de gritar ao motorista “Pare aí, se faz favor”.
Acendeu-se uma luz. Uma luz que habitualmente transporta a sombra de um novo “STOP”. Mas não. Desta vez, estava lá bem coladinho um papel que dizia “Boas Festas”. Sorri. Achei uma situação muito bem arquitectada. Muito bem conseguida por sinal. Da mesma maneira como colocamos uma flor no tabuleiro do pequeno-almoço do nosso amor quando este se encontra doente. Um toque especial.
Quantos toques especiais destes conseguimos dar ou receber por entre o fumo das cidades? Das incertezas dos bons dias e até dos “felizes anos novos fingidos”?
Só queria uma coisa simples. Uma coisa que me fizesse recordar com um sorriso, já que é tão difícil soltar a gargalhada.
Até agora os motoristas têm-me surpreendido neste sentido.
Gosto de viajar de autocarro para dar o gosto ao sorriso.
E Boas Festas que isto dura até dia 6.